Atenção Primária e os Desafios para o Acesso Universal à Saúde foi o tema da aula inaugural da 2ª turma do Projeto Integra, ocorrida na noite da quinta (14/10). A aula virtual aberta foi realizada pela pesquisadora da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz) Ligia Giovanella que, ao lado de outros pesquisadores, denunciou o desmonte das políticas da área no Brasil.
Conhecida como “porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS)”, a Política Nacional de Atenção Básica (Pnab) tem vivido um processo de “desmonte”, em especial durante a gestão do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (2019-2020). “Houve um desmonte da Atenção Primária, em especial do gestão do Mandetta, um desmonte do modelo assistencial comunitário com ameaças à universalidade”, disse, evidenciando a redução do número de Agentes Comunitários de Saúde e de Endemia no Brasil.
A pesquisadora ressaltou também o momento de luto com as 600 mil vidas perdidas. “É impossível não se solidarizar com as famílias das pessoas que morreram. É um empenho da atuação da União para a ampla disseminação do vírus [da Covid-19] em território nacional. Um governo genocida com cumplicidade de todos os ministérios. A CPI [da Pandemia] tem mostrado a irresponsabilidade do governo federal. Teríamos 131 mil mortes [e não 600 mil] se tivéssemos adotado as medidas corretas”, afirmou.
Ela também informou que entre 2013 e 2019 houve redução das visitas mensais das equipes de Saúde da Família em diversas moradias pelo país. “É um efeito após o ‘golpe’ [político de 2016], que reduziu o número de agentes comunitários nas equipes”.
A conselheira nacional de saúde Débora Melecchi afirmou que “o CNS vem se manifestando de forma muito presente em relação a todos esses retrocessos, exigindo o fortalecimento da Atenção Básica”. Ela lembrou do “Programa Saúde com Agente”, do Ministério da Saúde, criado recentemente sem debate com o controle social.
No dia 6 de outubro, o CNS divulgou Parecer Técnico nº 194/2021, que traz um conjunto de recomendações ao novo programa. O parecer integra a Recomendação nº 29 do CNS, de 21 de setembro deste ano. O “Saúde com Agente” foi discutido no primeiro semestre deste ano na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e pactuado entre os gestores das três esferas de governo, porém sem a participação do Conselho.
Jorge Bermudez, também pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/Fiocruz), ressaltou que o “Projeto Integra é a luta para assegurar o direito às politicas públicas, a importância da Atenção Básica como porta de entrada no SUS, apesar do subfinanciamento e desmonte das políticas publicas”.
Ronald dos Santos, presidente da Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar), lembrou de quando participou da Conferência Global sobre Atenção Primária à Saúde, realizada em 2018, em Astana, no Cazaquistão. O evento foi organizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), com coordenação com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Na época em que era presidente do CNS, Ronald representou o controle social brasileiro diante de diversas organizações internacionais públicas e da sociedade civil, além de instituições acadêmicas e ministros de saúde de diferentes países do mundo.
“Mesmo com o Brasil não enviando representação oficial, fizemos questão de ir como controle social. Houve manifestação dos 5 continentes em referência à experiência brasileira de SUS e Atenção Primária. Com o Projeto Integra, estamos construindo forças social, técnica e política para o enfrentamento desse embate”.
O Projeto
O Projeto Integra, promovido pelo CNS, Fiocruz, ENF e Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), foi lançado em junho deste ano, recebendo mais de 1.800 inscrições. A primeira turma atendeu 400 alunos e a segunda turma conta com aproximadamente 500 participantes.
Segundo Silvana Leite, coordenadora coordenadora geral da Escola Nacional dos Farmacêuticos (ENF), “são 20 turmas em todas as regiões do Brasil, por todos os estados. Pessoas ligadas aos movimentos sociais, aos conselhos de saúde, estudantes. São diversas experiências e contribuições para debatermos a integração das políticas e das práticas em Saúde”.
O objetivo do Projeto Integra é construir uma rede de lideranças que devem contribuir para a construção de melhores condições para o enfrentamento aos problemas de saúde, em especial os gerados pela pandemia de Covid-19. Os alunos têm oito aulas semanais, com temáticas específicas para o debate, entre elas a produção e acesso às vacinas, testagem e rastreamento de contatos na pandemia, desabastecimento em medicamentos, Atenção Básica e Vigilância em Saúde
O público é formado por profissionais e gestores da saúde, conselheiros de saúde, nas três esferas de gestão, movimentos sociais, entidades da sociedade civil organizada, professores, pesquisadores e estudantes. As aulas do Projeto Integra também serão etapas preparatórias para o 9º Simpósio Nacional de Ciência, Tecnologia e Assistência Farmacêuticas (9º SNCTAF), previsto para ocorrer em julho de 2022.
Assista à aula inaugural na íntegra
Foto: Abrasco
Ascom CNS