Fernando Pigatto, presidente do CNS, defendeu a importância do diálogo e da mobilização popular para a defesa do SUS em cenário de desfinanciamento
Para 75% da população brasileira, o Sistema Único de Saúde (SUS) é a única forma de acesso aos serviços de assistência à saúde. Considerando essa realidade, o Ministério Público do Paraná sediou nesta quarta e quinta-feira, 24 e 25 de outubro, o seminário nacional “SUS: contextualização, cenários de crise e possibilidades de atuação do Ministério Público”. O evento reuniu promotores e procuradores de Justiça de todo o país, gestores das esferas federal, estaduais e municipais e representantes de organizações da sociedade civil para debates sobre os atuais desafios enfrentados pelo setor.
Abertura – Recepcionando os presentes e dando início ao encontro, o procurador-geral de Justiça, Ivonei Sfoggia, falou sobre a iniciativa. “As bases constitucionais do SUS estão sob grave risco e, durante esses dois dias, do conjunto de vozes presentes aqui em Curitiba, se ouvirá a reafirmação da importância do Sistema que é modelo em todo o mundo e que tem no Ministério Público um de seus maiores defensores”.
A mesa de abertura foi composta ainda pelo ouvidor-geral do MPPR, Ney Zanlorenzi; o corregedor-geral da instituição, Moacir Gonçalves Nogueira Neto; a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade de Lima; o presidente do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais, Paulo Passos (procurador-geral de Justiça do MP do Mato Grosso do Sul); a coordenadora do Grupo Nacional de Direitos Humanos do CNPG, a procuradora-geral de Justiça do MP da Bahia, Ediene Santos Lousado e a procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho, Margaret Matos de Carvalho.
Perspectivas – No painel sobre as “Perspectivas da crise da saúde no Brasil”, a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade de Lima, abordou questões que mostram a importância da universalização do acesso à saúde para a construção dos direitos sociais no Brasil. “Foi a partir do SUS que passamos a ter no país uma mudança de conceito de cidadania excludente para uma noção de cidadania inclusiva”, afirmou. Além disso, falando do perfil da Fiocruz na produção de pesquisa e conhecimento, Nísia citou o aprimoramento nos kits de diagnósticos de doenças como Zika, Dengue e Chikungunya. “O SUS não é somente atenção à saúde. Além de atender a população com a realização de procedimentos altamente custosos, é importante lembrar-nos do componente da produção de ciência, tecnologia e inovação.”
O procurador de Justiça Marco Antônio Teixeira, coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção à Saúde Pública do MPPR, ressaltou a importância da participação social na construção das políticas de saúde. “O Sistema Único de Saúde não tem salvação se não nos reaproximarmos da população. A sociedade deve entender o sistema e ser seu principal defensor” disse, mencionando a experiência do MPPR com o Suscom+.
À frente da principal entidade de deliberação sobre as políticas de saúde no país, o Conselho Nacional de Saúde, que conta com representação da sociedade civil e do poder público, Fernando Pigatto falou sobre a importância do diálogo e da mobilização popular. “A participação que tivemos em torno da última Conferência Nacional de Saúde, por exemplo, mostra que as pessoas estão dedicadas à busca de soluções para os problemas existentes. E isso ocorre porque elas estão sentindo diretamente, em seu dia a dia, as consequências da aprovação da Emenda Constitucional 95, como o atraso no agendamento de consultas e exames e o acesso a medicamentos”, afirmou, referindo-se ao dispositivo legal aprovado em 2016 que congelou por 20 anos os gastos públicos na área. A mediação do debate ficou a cargo de Vera Lúcia Edais Pepe, pesquisadora da Fiocruz.
Crise – Em outro debate, sobre a perspectiva histórica da atual crise da saúde no Brasil, a professora e pesquisadora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Lígia Bahia, uma das referências nacionais nas discussões sobre o SUS, falou sobre os desafios atuais. “Estamos vivendo um período em que, ao mesmo tempo em que ainda é preciso modernizar o sistema, de modo a aprimorá-lo, ainda temos que resistir ao desmonte que está em curso.” E completou: “Por que somos a favor do SUS? Porque sabemos a potência que a saúde pública tem para resolver problemas sociais”. A pesquisadora da Fiocruz, Tânia Maria Peixoto, coordenou a mesa.
Segundo dia – No segundo dia de evento, no debate sobre os atuais caminhos da tutela individual e coletiva em saúde, o promotor de Justiça do MPPR Marcelo Maggio afirmou que “saúde é mais que um direito fundamental, é um valor presente no meio social. E é por isso que, nesse sentido, deve existir, obrigatoriamente, uma preocupação de que esse direito seja tutelado e garantido por meio de políticas públicas”. Na Conferência “Direito à Saúde e caminhos para a defesa do SUS constitucional”, o presidente do Instituto de Direito Sanitário Aplicado (Idisa), Nelson Rodrigues dos Santos, destacou o que chamou de “ilhas” do sistema, que são as experiências exitosas e reconhecidas internacionalmente, como o funcionamento de serviços como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), o programa de imunização e os transplantes de tecidos e órgãos, entre outros. Falou também sobre a formação dos profissionais que atuam no sistema. “No decorrer desses 30 anos, foram gerados saberes e conhecimentos, muitas vezes não pela Academia, mas diretamente pela militância do SUS. E hoje temos mais de 1 milhão de trabalhadores no sistema e estamos na terceira geração desde a sua criação, e seguimos com a mesma garra e entusiasmo daqueles que o idealizaram pois acreditamos nele.” Essa última mesa também contou com a participação da pesquisadora da Fiocruz, Joyce Andrade Schramm.
Outros temas – A programação também contou com painel sobre “Financiamento da saúde no Brasil”, que teve exposição do pesquisador da Faculdade de Saúde Pública da USP, Áquilas Nogueira Mendes e coordenação de Guilherme Souza Cavalcanti, da Universidade Federal do Paraná. Sobre “Os atuais caminhos da tutela individual e coletiva em saúde”, além de Marcelo Maggio, a mesa de debates contou com a participação de Fernando Mussa Aith, da Faculdade de Saúde Pública da USP.
As discussões sobre as fragilidades e possíveis soluções para a questão da judicialização da saúde ficaram a cargo do promotor de Justiça do MP do Acre Gláucio Oshiro e do presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Alberto Beltrame, com coordenação do promotor de Justiça do MPDFT, Jairo Bisol. Outra mesa tratou do “Sistema Único de Saúde Constitucional e o Sistema Único de Saúde real: convergências em momentos de crise” com intervenções da cientista política Telma Maria Gonçalves Menicucci, da pesquisadora da Fiocruz Lígia Giovanella e do presidente do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems), Willames Freire. A mediação foi da coordenadora da Comissão Permanente de Defesa da Saúde (Copeds/CNPG), Isabel Maria Porto.
Realização – O evento foi promovido pelo Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG), por meio de sua Comissão Permanente de Defesa da Saúde (Copeds), em conjunto com o Ministério Público do Paraná, e em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Escola Nacional de Saúde Pública) do Ministério da Saúde.
Fonte: MPPR