Por: Wanderley Gomes da Silva*
Historicamente, depois de 1945 surgiram às primeiras experiências de direitos universais no mundo, com destaque para o National Health Service (NHS), na Inglaterra. E mais recentemente, com a Constituição de 1988, nasce no Brasil o Sistema Único de Saúde – SUS. Com a Constituição avançamos de forma significativa em termos de política universal, a qual os conservadores que usurparam o poder recentemente querem desmontar.
A lógica dos neoliberais é que a democracia não cabe no orçamento. Como se o orçamento não fosse uma peça importante no debate do tamanho do estado na construção do projeto nacional de desenvolvimento de um país.
A recomposição do capitalismo pós-crise imobiliária de 2008 vem colocando na ordem do dia a diminuição do papel do estado nas políticas públicas entre outras medidas de caráter restritivo que vem fragilizando a soberania das nações. Na mesma lógica os representantes do pensamento neoliberal aqui no Brasil defendem que o mercado deve regular 100% das políticas de estado: isto significa que os interesses do capital deve estar no comando da gestão pública, seja através da terceirização dos serviços, das fundações, entre outras formas de gestão privada.
É comprovado que os gastos do orçamento nas políticas públicas contribuem consideravelmente na movimentação da economia, seja através dos empregos diretos ou indiretos ou no financiamento de projetos socialmente inclusivos. Esse tipo de gasto é fundamental nas políticas sociais do país, numa perspectiva desenvolvimentista, na lógica de um projeto includente, sustentável, soberano e democrático. Considerando que ele define o tipo, o papel e o tamanho do estado no financiamento do projeto de nação, nesse sentido é estratégico o debate do tamanho do orçamento enquanto instrumento que potencializa as políticas públicas de saúde e educação entre outras que amplie a universalização dos direitos sociais, do acesso à cidadania e do fortalecimento do estado nacional nas atividades econômicas estratégicas ao desenvolvimento do país e sua soberania nacional.
Sabe-se que o golpe de estado no Brasil faz parte da recomposição geopolítica no mundo, em que o capital financeiro internacional utiliza de instrumentos políticos, econômicos, diplomáticos e quando necessário militar, para impor seus interesses numa região ou em um país de referencia regional.
Hoje os golpes de estado se dão através do parlamento, da grande mídia, do Judiciário, e com apoio de setores reacionários comprometidos com os interesses estrangeiros. Importante ressaltar que a viabilização dos seus objetivos estratégicos consiste na aprovação de emendas antidemocráticas à Constituição Federal, como forma de legitimar a retirada de direitos sociais e trabalhistas. Outra trincheira dos conservadores é a via diplomática, com ações que objetivam enfraquecer a liderança do Brasil na América Latina. Adiciona-se a esta lógica a opção dos conservadores pelo distanciamento com os países que compõem o BRICS. Essas medidas comprovam que as forças que hoje estão no comando central da República estão implementando uma política de alinhamento ao grande capital, em particular o o norte-mericano. Uma das vertentes de enfraquecimento do Estado nacional foi à aprovação no congresso nacional da política de privatização do patrimônio público, na entrega dos serviços públicos a iniciativa privada-PP, caso mais recente a privatização das telecomunicações e a entrega de todo patrimônio desse setor ao capital, o que na prática inviabiliza o projeto de desenvolvimento soberano do país.
Com o advento do golpe, o que está em discussão é se o orçamento estará a serviço dos mercados ou do estado, do desenvolvimentismo ou do rentísmo, em fortalecer a saúde pública ou a saúde privada. Esta deve ser nossa preocupação no atual quadro político: a centralidade da nossa reflexão estratégica. Nesse sentido, temos aí um conflito de interesses que não é técnico, mas político e de projeto de nação. Projeto para qual classe e, com qual conteúdo de classe? Esse é o grande debate nacional. Vamos impedir que o país caminhe para a barbárie, vamos lutar pelo progresso social, por um projeto que nos aproxime da transição rumo a uma sociedade mais avançada e socialmente mais justa e democrática.
Está na lógica do sistema capitalista a limitação de direitos sociais e trabalhista, menos direitos para o povo e mais lucro para o capital, o paraíso para as elites e o martírio para a classe trabalhadora. O exemplo mais emblemático na conjuntura atual é essa proposta conservadora do governo Temer chamada de “Uma ponte para o futuro” – que na verdade é um ataque aberto aos direitos sociais duramente conquistados nos últimos trinta anos pela sociedade, além da retirada de direitos conquistados nos últimos oitenta anos, com destaque os ataques a CLT entre outras de valor histórico, as elites querem de volta a Velha República, os tempos de um país desindustrializado e agrário, destruição de todas as conquistas pôs revolução de trinta, querem de volta aquele estado que dependia do estrangeiro para tudo.
Diante da profunda recessão econômica precisamos lutar para que o Estado invista mais em políticas públicas como meio de garantirmos mais acesso da população aos serviços de qualidade, na valorização do trabalho, garantindo mais direitos sociais. Considerando que no momento a luta aberta entre a democracia e a barbárie é o termômetro da luta de classes, luta entre e os interesses do capitalismo e dos trabalhadores, entre o mercado e o estado, dos interesses daqueles que estão querendo impor a todo custo no Brasil. A “ponte para o futuro” que não levará o Brasil a um porto seguro, mas sim ao acirramento do conflito social, e é por isso que o campo progressista defende o fortalecimento do estado enquanto os neoliberais o mercado. O momento exige a construção de uma Frente Ampla em defesa dos direitos, da democracia e da soberania nacional.
Outro fator de alta relevância é que o desmonte do SUS, enquanto parte do desmonte do Estado Nacional tem como tônica a privatização dos serviços públicos, a precarização do trabalho, na lógica do capital é imperioso a desregulamentação de tudo, da terceirização geral no trabalho a diminuição do tempo de aposentadoria como a retrógada proposta de reforma da previdência entre outras restrições sociais e democráticas de dimensão histórica. É com a orientação do mercado e a serviço do capital financeiro que atualmente esta gente administra o país.
Algumas das propostas conservadoras colocadas como alternativas à crise econômica é a diminuição do tamanho e o caráter do SUS, transformando num SUS para pobres, sem qualidade, universalidade e equidade; diante dessa lógica conservadora é urgente aprofundar o debate da saúde pública, como a Desvinculação de Recursos da União, dos Estados e dos Municípios nesta e em outras políticas públicas, além da incorporação no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2017 da União (PLDO 2017) do dispositivo da antiga PEC-24155 que congela as despesas primárias no nível de 2016 por 20 anos, principalmente as sociais, o que representará uma queda das despesas per capita e reduzirá drasticamente o já insuficiente financiamento do SUS e da Seguridade Social em 413 bilhões. Exemplo, se a EC 95 estivesse em vigor a partir de 2003, deixariam de ser investidos no SUS nesse período R$ 135 bilhões até 2015, uma perda anual média de recursos equivalente a R$ 21 bilhões (ou cerca de 20% a menos do que foi aplicado pela União em 2015 em ações e serviços públicos de saúde).
O SUS é fundamental para o Brasil porque, apesar de todas as suas dificuldades, ele é um dos sistemas de saúde mais avançados do mundo, seu sentido de universalidade e de equidade torna-o democrático, importante destacar que ele é a expressão mais acabada enquanto conquista social consagrada na Constituição cidadã de 1988; preservá-lo num país em desenvolvimento, em recessão econômica e sob- feroz ataque aos direitos sociais significa fazer o contraponto da lógica neoliberal, é tratar a saúde pública enquanto política de Estado.
Apesar dos ataques diários da grande mídia o SUS é fundamental na vida da nação, o momento exige seu fortalecimento, considerando que ele por sua importância faz a diferença para parcela majoritária da população quando o assunto é saúde pública de qualidade, universal e equânime.
Fazer a privatização do SUS é cometer crime de “lesa pátria”, é levar milhões de brasileiros a morrer sem atendimento. Defende-lo na atualidade significa defender o estado numa política estratégica condicionada à qualidade de vida do povo, isso pressupõe que precisamos reforçá-lo através do financiamento adequado e perene ao seu pleno funcionamento. Atualmente, os gastos públicos consolidados em saúde (federal, estaduais e municipais) equivalem a 3,9% do PIB no Brasil; é preciso lutar para que se atinja gasto público mínimo segundo parâmetros internacionais para sistemas de cobertura universal, ou 8% do PIB, que é o mínimo internacional para gastos públicos com sistemas de acesso universal como o SUS, para que ele possa cumprir sua função social que é a de garantir saúde de qualidade com universalidade, equidade e aumento de cobertura ao povo brasileiro.
Quando o governo Temer aprovou a PEC 93 de desvinculação das receitas da União, estado e municípios para a saúde. Os conservadores aprovaram diminuir os gastos público com a saúde pública, na prática aceleram a destruição da estrutura do SUS. Porem o maior e devastador ataque a saúde pública no Brasil foi à aprovação da EC 95 que congela por 20 anos os gastos federais na saúde, estendendo este crime as demais políticas públicas, na prática essa orientação neoliberal resultará na extinção em curto prazo do SUS por absoluta “asfixia financeira”.
Na verdade, precisamos combater os interesses daqueles que apoiaram o golpe de estado e que hoje cobram a conta via Ministério da Saúde, cobrança que é expressa na proposta de expansão do mercado de planos de saúde, na acintosa proposta do chamado plano popular de saúde. Com destaque aos que atuam no complexo industrial da saúde, que estão muito interessados na privatização do setor, seja na gestão, na área de insumos, tecnologia de informação ou medicamentos.
Precisamos analisar este contexto tendo em consideração que a saúde pública e privada em conjunto representa 8,2% do PIB brasileiro. Trata-se de uma atividade econômica que vai muito além da prestação de serviços à população é, portanto, uma área de grande interesse e disputa do capital nacional e internacional.
Por isso, é preciso que a sociedade brasileira lute pelo SUS constitucional, aquele que garante a saúde como um direito. Um SUS universal, com qualidade e equidade, enquanto obrigação do Estado e direito do cidadão; não permitamos a volta do tempo anterior ao SUS em que os mais pobres eram tratados como indigentes e a atenção à saúde estava garantida somente para aqueles que faziam parte do mercado formal de trabalho.
A luta pelo SUS preconizado na Constituição é parte da luta pelo restabelecimento da democracia, pela normalidade da vida democrática do país, significa que o povo brasileiro precisa derrotar o golpe de estado que colocou a frente da presidência da república um governo ilegítimo que é fruto desse golpe. Precisamos o quanto antes eleger o presidente da República através do voto popular. Nesse sentido é importante reafirmar; Pela democracia, Diretas já.
Defesa da Constituição Federal do Brasil
Defesa da Democracia
Defesa dos Direitos
Defesa do SUS
*Wanderley Gomes da Silva é conselheiro nacional de saúde, coordenador da Comissão de Financiamento e Orçamento (Cofin), representante da Confederação Nacional das Associações de Moradores.