“É lamentável que o Programa Nacional de Imunização não esteja ouvindo os movimentos sociais e conselhos de saúde sobre as questões de prioritários”, disse o conselheiro Artur Custódio durante a audiência
O Conselho Nacional de Saúde (CNS) participou, nesta terça-feira (13/04), de uma audiência pública na Câmara dos Deputados sobre as novas variantes da Covid-19. Ações conjuntas de vacinação ampla, testagem em massa, uso de máscaras, isolamento social e lockdown estão entre as recomendações discutidas pelos participantes da videoconferência para tentar interromper a disseminação do vírus.
Segundo o biólogo e virologista Anderson Brito, as mutações virais ocorrem na etapa de cópia do material genético do vírus, ao infectar uma pessoa. Por isso, a única forma de impedir o surgimento de novas mutações é evitar a transmissão de uma pessoa para outra. Ele ainda observou que as novas variantes têm capacidades diferenciadas, pois acumularam variações que dão a elas maior transmissibilidade. Com maior transmissibilidade e, portanto, maior número de casos, é natural que haja mais mortes por Covid-19. “A gente tem de fazer testagem em massa, porque a gente precisa detectar quem tem o vírus. Para saber se o vírus detectado tem alguma variação genética, aí a gente tem que fazer o sequenciamento genético”, afirmou.
O biólogo ainda acrescentou que o Brasil está no vermelho no que diz respeito à vigilância genômica, com sequenciamento de menos de 0,004% dos casos diagnosticados, o que leva a um desconhecimento das variantes que circulam no País. Atualmente, principalmente três cepas preocupam os cientistas no mundo: a do Reino Unido, a do Brasil e a África do Sul. Segundo lembraram os participantes do debate, o Brasil vive uma sincronização da pandemia, com maioria dos casos sendo causados pela variante P.1, surgida em Manaus.
De acordo com a professora Esther Sabino, do Instituto de Medicina Tropical da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, esse espalhamento da variante se deu por meio de voos saídos de Manaus, especialmente com destino a São Paulo e a Brasília. “Novas variantes vão surgir. As vacinas vão funcionar? Tudo indica que sim, mas talvez seja necessário fazer modificações. Por isso é importante continuar a vigilância genômica”, ressaltou a professora. “Se a transmissão não cair, vamos ultrapassar as 600 mil mortes nos próximos 100 dias”, alertou.
Para o conselheiro nacional de saúde Artur Custódio, que coordena a Comissão Intersetorial de Vigilância em Saúde (Civs) do CNS, neste momento em que novas variantes estão surgindo, só existe uma forma de enfrentamento: a vacinação em massa. “Não adianta comprar vacinas para um grupo específico porque não há vacinas e isso é uma forma de furar a fila. É lamentável que o Programa Nacional de Imunização não esteja ouvindo os movimentos sociais e conselhos de saúde sobre as questões de prioritários. Vários grupos estão sendo deixados para trás”, afirmou.
Artur ainda destacou as diversas ações que têm sido realizadas pelo CNS para o enfrentamento à pandemia. “Por diversas vezes o CNS se manifestou e antecipou problemas que aconteceram. Nossa avaliação é que se as resoluções e recomendações do Conselho tivessem sido ouvidas poderíamos ter preservado a vida de, pelo menos, 3 pessoas a cada 4 mortes”, completou Artur.
Dificuldade
Na opinião do deputado Alexandre Padilha, que solicitou a videoconferência, é angustiante o país estar vivendo a atual situação passado um ano desde o início da pandemia. “O Brasil de fato se tornou uma grande ameaça global, pelo risco de ser um terreno fértil para o surgimento de novas variantes”, criticou.
Padilha quis saber do Ministério da Saúde o que foi feito para ampliar a capacidade nacional de vigilância epidemiológica, principalmente após o transporte de pacientes de Manaus para tratamento em outros estados.
A assessora técnica do Programa Nacional de Imunizações do Ministério da Saúde, Walquíria Almeida, admitiu a dificuldade da pasta para desenvolver o monitoramento de contato.
“A gente conseguiu implementar uma plataforma de monitoramento de contato, mas aplicar dentro de um país com 200 milhões de habitantes é muito difícil. Existe uma dificuldade dessa compreensão”, explicou. “A gente está trabalhando nisso também. Com as novas variantes, a gente viu a situação de emergência. A gente está discutindo isso, mas isso não está totalmente implementado.”
Araraquara
O prefeito de Araraquara (SP), Edinho Silva, trouxe o exemplo da cidade para a reunião. Após a detecção de uma alta transmissão doméstica da variante P.1 no município, foram tomadas medidas mais fortes, que incluíram lockdown.
“Se você não tem vacinação em massa, só tem uma forma de conter o contágio. É não permitir que o paciente doente entre em contato com uma pessoa saudável. Tiramos o transporte público de circulação e fechamos inclusive supermercados nos primeiros seis dias, depois cedemos. Tomamos todas as medidas necessárias e permitimos que só farmácias e unidades de saúde permanecessem abertas. Depois de dez dias retomamos o transporte público”, listou Edinho Silva.
O prefeito admitiu que o lockdown é uma medida dura e, por isso, é importante uma política de crédito para setores afetados economicamente.
Edinho Silva destacou ainda a dificuldade para montar equipes médicas para o enfrentamento da Covid-19, em razão da carência de profissionais intensivistas.
A deputada Dra. Soraya Manato, que também sugeriu o debate, afirmou que a pandemia de Covid-19 desnudou o problema de saúde no Brasil. Ela se mostrou preocupada com a dificuldade apontada por Edinho Silva. “Não adianta contratar qualquer um. Tem de ser aquele específico para lidar com o paciente que tem complicações muito graves”, defendeu a parlamentar.
Foto: Marcelo Seabra / Agência Pará
Ascom CNS, com informações da Agência Câmara de Notícias